sábado, 11 de julho de 2009

Sobre anemia falsiforme

Anemia Falciforme atinge 5% da população brasileira
Dr. Rosana Cipolotti explica como é feito o diagnóstico e quais as principais formas de tratamento,
11/07/2009 - 12:09

Dr. Rosana Cipolotti diz queTeste do Pezinho feito no Estado não detecta Anemia Falciforme
A Anemia Falciforme é uma das doenças genéticas mais comuns no Brasil. Ela é caracterizada por uma deformação nas células vermelhas do sangue – conhecidas como hemácias –, causada pela deficiência na absorção de oxigênio pela hemoglobina, proteína responsável por levar o gás até as células. Assim, as hemácias com essa deformação - que as deixa em formato de foice -, prejudicam o fluxo sanguíneo e diminuem o suprimento de oxigênio a membros e órgãos. Com isso, desenvolve uma série de problemas.
Estima-se que ela atinja 5% da população brasileira. Por ser uma doença genética e hereditária, não possui cura, podendo ser diagnosticada aos primeiros dias de vida, quando o bebê realiza o Teste do Pezinho.
Para explicar um pouco do que é a Anemia Falciforme, que ainda é pouco conhecida, o Portal Infonet entrevistou a Dr. Rosana Cipolotti, pediatra especialista na área de hematologia e professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Ela explicou as formas de tratamento, o porquê das dores que os pacientes sentem e os principais problemas referentes à doença.
Portal Infonet - Como pode ser feito o diagnóstico da Anemia Falciforme?Dr. Rosana Cipolotti - É possível fazer um primeiro diagnóstico já no Teste do Pezinho, com a retirada de uma quantidade pequena de sangue no calcanhar. Com o exame, dá para se descobrir uma série de doenças, incluindo outras hemoglobinopatias. Como ele é feito atualmente no Estado, de forma gratuita, não cobre essa parte da anemia falciforme, mas outros Estados já. Minas Gerais foi o primeiro, mas o Rio de Janeiro, a Bahia e algumas cidades de São Paulo e do Rio Grande do Sul também fazem o mesmo. A gente ainda não faz, apesar de ter uma grande ocorrência aqui em Sergipe.
Portal Infonet - O que é necessário para que o teste do pezinho gratuito envolva a descoberta desse tipo de doença?RC - Depende da Secretaria [de Estado] da Saúde [SES] implante essa idéia. Só o teste do pezinho feito através do convênio, atualmente, permite fazer esse diagnóstico. O que o SUS [Sistema Único de Saúde] cobre só faz testes para descobrir fenilcetonúria e hipotireoidismo.
Portal Infonet - E como a criança que não faz esse exame nos primeiros dias de vida pode descobrir se possui a anemia?RC - Num segundo momento, quando a pessoa passa a apresentar os sintomas - e isto costuma acontecer depois dos seis meses de idade -, começa a surgir anemia, icterícia (o amarelamento da pele e das mucosas). Podem surgir infecções, pneumonias, aumento do baço e inchaço e dor nas articulações. Isto leva a suspeitas numa criança muito pequena. Aí é feito a um exame chamado eletroforese.
Portal Infonet - Quais são os principais mitos e verdades sobre a doença?RC - O grande problema é o desconhecimento. Nós temos um dado de que 5% das pessoas saudáveis são portadores do gene que causa a Anemia Falciforme. Apesar de ser a doença genética mais comum no Brasil, ela é muito pouco conhecida e com freqüência, ao ser dado o diagnóstico, a família sempre diz que nunca ouviu falar. Os próprios médicos, ás vezes, não têm conhecimento.
Aqui [no Hospital Universitário], por sermos uma escola, os alunos que passam por nós são treinados no Ambulatório, que tem um trabalho de mais de 20 anos. Acontece de pessoas virem de outros Estados por terem sido atendidos por médicos que não tem essa formação e desconhecem o problema.
Portal Infonet - Quais são as principais características da Anemia Falciforme?RC - Por ser uma doença genética ela não é curável, mas algumas medidas de controle permitem que pessoa tenha uma vida saudável, de qualidade, ainda que sob vigilância. A pessoa pode chegar à vida adulta e ter uma sobrevida normal. Quanto mais tarde é dado o diagnostico, mais intensas são as complicações e elas podem levar à morte e ao Acidente Vascular Cerebral [AVC], ou derrame. Neste caso, quando um AVC acomete pessoas muito jovens, a anemia falciforme é uma possível causa.
Há também complicações pulmonares agudas e crônicas, lesões de vasos que levam a várias doenças, inclusive insuficiência cardíaca. Doenças renais, que podem exigir hemodiálise e transplante de rins. Ela é uma doença que por estar no sangue e envolver oxigenação dos tecidos, pode comprometer qualquer sistema e geralmente mais de um acaba sendo comprometido.
Portal Infonet - Qual é a explicação para as crises de dor intensa que muitos pacientes apresentam resultando, em alguns casos, na internação hospitalar?RC - A dor é causada pela falta de suprimento de oxigênio nos tecidos, isso causa a dor. As crises são características da doença. O controle da anemia faz com que as crises sejam diminuídas, diminuindo as possibilidades de aparecerem as dores.
Portal Infonet - Em que casos pode ocorrer a morte precoce do paciente?RC - Até duas ou três décadas, pelo desconhecimento e por ser uma doença cuja origem do gene é africana, os países que receberam imigração, principalmente por escravos, essa doença se restringia às camadas mais pobres da população. Com a miscigenação ela atinge todas as classes e não se priva à cor da pele ou qualquer outro aspecto particular nesse sentido. À medida que ela foi acometendo todas as classes sociais, ela foi despertando mais interesse e mais formas de tratamento surgiram.
A gente tem hoje possibilidades de tratar e garantir, ou pelo menos proporcionar, uma vida de boa qualidade pros pacientes. Existe ainda um risco de morte maior que as das pessoas saudáveis, mas não e uma doença com prazo de validade, de jeito nenhum.
Portal Infonet - E quais são os procedimentos mais realizados no sentido de amenizar os sintomas da doença?RC - O tratamento curativo é o transplante. Para o paciente que tem Anemia Falciforme, ele é feito com as mesmas restrições que possui para aquele que tem leucemia e também precisa de um transplante. Ter um doador compatível, principalmente. Por ser um procedimento que envolve um risco, tem que se contrabalancear o risco do transplante com o risco da própria doença.
Portal Infonet – Além do transplante o que mais pode ser feito?RC - Em alguns pacientes com evolução mais leve, o transplante pode não ser o mais indicado. Há outras formas de tratamento, comuns a todos os pacientes, como a prevenção de infecções desde o nascimento, o uso de medicação profilática e das vacinas, não só as habituais, usadas pra todo mundo, mas também as vacinas especiais pra prevenir algumas infecções. Isso é obrigatório e todo paciente deve passar.
O mais importante é fazer o tratamento rigoroso de infecções e das anemias mais graves. O paciente tem de ter acesso ao tratamento e isso nós mantemos, com o serviço do HU estando com portas abertas. O paciente tem acesso assim que precisar. Além disso, há o uso de algumas medicações, entre elas a Hidroxuréia, que é uma medicação de uso mais recente, pra adolescentes e crianças, e que tem se mostrado muito promissora.
Portal Infonet - Algumas pessoas apresentam ‘Traços de Anemia Falciforme’ e, outras, a própria Anemia Falciforme. Como isto pode ser explicado?RC - O traço é a característica genética que permite que pessoa tenha a capacidade de transmitir a doença, mas que não a desenvolva. Ter a doença significa que a pessoa herdou os traços do pai e da mãe. Então possuindo o traço, o pai e a mãe transmitem esse gene e essa característica para o filho e, aí, o filho, tem a doença completa. O traço é só a capacidade de transmiti-la.

Um comentário:

Ariovaldo disse...

A Dra Rosana Cipolotti está de parabéns pelas explicações que ajudam em muito à esclarecer a população sobre a Anemia Falciforme
que ainda é bem mal informada e até mesmo entre a classe médica, uma das razões para a drástica carência de médicos pediatras no mercado de trabalho.